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Chegada da procissão de barcos |
Uma manhã chuvosa interrompe os ensolarados dias que se
sucederam até 07 de setembro. É manhã, e o dia que sucede ao aniversário da Independência
do Brasil traz com a chuva uma procissão de barcos que sobem o curso do rio
Araguaia à localidade conhecida por todos nós como Siriaco – é o festejo de
Nossa Senhora de Nazaré, que mais uma vez se realiza às margens do Araguaia,
reunindo uma grande família e seus amigos que chegaram a esta região ainda nos
anos 1920.
O acompanhamento da realização do festejo neste ano foi uma
iniciativa da aluna Iraene, da 2ª série do ensino médio do CEJMS, que pretende
reunir informações sobre a religião, a cultura e o valor turístico da região do
extremo Bico do Papagaio com o objetivo de elaborar um projeto com o qual possa
concorrer ao programa Jovem Deputado do ano que vem. Sua atitude é espelhada no
aluno Ian Mota, da 3ª série “A”, escolhido jovem deputado através de um projeto
que tratava da importância da ética aplicada à tecnologia. Acompanharam a aluna
Iraene o aluno e deputado jovem Ian Mota, o professor de História do CEJMS,
Antonio Marcos, e o senhor Juvenal, que há anos auxilia a escola em algumas
atividades.
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Os alunos Ian Mota e Iraene |
A família Siriaco chegou a essa porção do Bico nos idos de
1920, sendo a atual geração realizadora da festa a terceira, que se refere aos
pioneiros como avós. Eles são oriundos da Terra Indígena Mãe Maria, localizada
no município de Bom Jesus do Tocantins, no estado do Pará, homologada em 20 de
agosto de 1986, pelo então presidente José Sarney.[1]
Os avós teriam vindo pra cá atraídos pelas matas de feição amazônica, que
abrigam sob suas folhagens terras férteis para a agricultura de subsistência. A
cidade de Marabá, posto de intercâmbio dessa família, distava da região dois
dias de viagem de canoa. Lá se vendiam os produtos cultivados nesta porção do
antigo Goiás para se adquirirem produtos próprios da cidade paraense. Aqui se
caçava, pescava, cultivava a mandioca e o arroz, atividades para as quais
estavam também dispostas as mulheres, que também quebravam coco babaçu.
Segundo uma entrevistada, a festa teve origem numa
circunstância relacionada a um parto e, contando apenas com canoas no início,
hoje a procissão dispõe de inúmeros barcos enfeitados que se aproximam ao som
de fogos. Ao aportarem nas terras tocantinenses, são recebidos com faixas
destinadas a saudarem especialmente a homenageada, Nossa Senhora de Nazaré. São
realizadas orações fervorosas à padroeira, próxima de cuja imagem se posicionam
os juízes, escolhidos anualmente para cada edição do festejo.
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A padroeira e os juízes |
A família Siriaco, hoje dispersa, habita a sede do município
de Esperantina, Marabá e outras localidades. Negros de feições indígenas, sua
trajetória nesta região os torna também importantes do ponto de vista da
reconstituição histórica dos aspectos de formação em geral do próprio extremo
Bico do Papagaio. Por estarem aqui há quase um século, puderam presenciar,
inclusive nas últimas décadas do século XX, eventos como a Guerrilha do
Araguaia e a presença de grileiros que pretendiam apossar-se dessas terras. No
que diz respeito à guerrilha, puderam abrigar aqui famílias assustadas com os
eventos, com medo da polícia ou dos “terroristas”. A menção inocente a
terroristas pode dar indícios de como uma mentalidade avessa à esquerda comunista
foi construída durante a ditadura militar para impedir que os populares lhes
fossem simpatizantes. Sobre os grileiros, mencionam os mesmos nomes já ouvidos
de outros antigos moradores que aterrorizaram a região fazendo pressão para
lhes tomarem as terras.
Essas informações sobre os Siriaco vão juntar-se a várias
outras sobre famílias da região e os aspectos culturais, religiosos e sociais
relacionados a elas, para comporem uma proposta de itinerário turístico,
cultural e religioso a ser elaborada pela aluna Iraene.
Boa sorte a ela.
Texto: Francisco Sulo.
Imagens: Profº Antonio Marcos e Ian Mota.